quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

.da dor ao suicídio

Existe associação entre dor persistente e suicídio? 


Decidi depois de arrumar nas estantes alguns livros discorrer sobre este assunto que foi colocado num grupo de discussões por um colega que me gerou algumas inquietações.


Por qual razão as pessoas abortariam uma vida já feita e estabelecida? A vida por muitos é tida como o bem mais precioso.

No ano de 2010, em um próspero país do norte do mundo, 38 mil pessoas optaram por matar-se. Seria uma média de 01 suicídio a cada quase 14 minutos.

A palavra suicídio vem da expressão latina “sui caedere”, que significa “matar-se”, e foi utilizada pela primeira vez em 1717 por Desfontaines. Este é um fenômeno especificamente atribuído à espécie humana.

Existem fatores de risco bem descritos na literatura sobre o risco para um suicídio consumado:

• Idade avançada;
• Gênero masculino;
• Tentativa anterior de suicídio;
• Distúrbios psiquiátricos (alguns deles apenas).

E o que é a dor? Podemos realmente defini-la?

Segundo a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) como sendo uma experiência emocional e sensorial desagradável associada com uma lesão tecidual real ou potencial ou descrita em termos de tal lesão. Entretanto quando Soren Kierkegaard postulou que quando você me rotula você me nega, o raciocínio de classificação do invisível (a dor) seria negá-lo? Como abraçar o invisível?

Pessoas acometidas por dor física persistente têm um enorme potencial de ativar uma cascata de eventos que estão direta ou indiretamente ligados ao risco de suicídio, afinal a dor física pode levar ao desenvolvimento de depressão e, esta por sua vez uma experiência, descrita como insuportável, de dor psicológica, que pode levar pessoas às vias de fato em um escape suicida.

A sensação de ser um fardo para seus entes queridos baseada na diminuição progressiva da sensação de bem-estar associada ao contexto do isolamento e sofrimento, onde a dor tornar-se o foco principal da vida do sujeito, minando pouco a pouco as relações interpessoais e a qualidade de vida.

Segundo Émile Durkheim a explicação deste fenômeno está na relação entre o indivíduo e a sociedade onde está inserido, a qual terá certa inclinação coletiva para o suicídio. Quanto mais profunda for à integração do indivíduo nos grupos sociais, menor a probabilidade de este se suicidar e vice-versa. Percebemos aqui, mesmo num contexto diferente como era o de Durkheim, que as relações sociais, ou seja, o não-isolamento era visto como importante.

Aos profissionais que lidam diariamente com pessoas em sofrimento nos mais variados níveis e nuances, saibam que existem escalas simples que podem ser aplicadas para verificar, por exemplo, o destemor sobre a morte [13-item Psychache Scale] e a [The Mee-Bunney Psychological Pain Assessment Scale - MBPPAS] utilizada para mensurar o sofrimento tangível à dor psicológica (nas palavras dos autores).

Hoje buscando por textos sobre o existencialismo achei uma obra intitulada “Joe” do ano de 2009, escrito por André D. Cancian.
Não poderia deixar de citar uma pequeno parágrafo da descrição da obra que chamou-me a atenção.
[...] Encarnando essa proposta, temos então Joe, um personagem essencialmente solitário e mal humorado, que odeia interações humanas, e cujos traços mais proeminentes são o sarcasmo, o cinismo e a apatia. Sua vida é basicamente uma sequência de eventos aleatórios, destituídos de significado, em que ele se vê acontecer inutilmente numa atmosfera de tédio e misantropia. Um detalhe é que em uma das chamadas de marketing havia um subtítulo [...] um convite ao suicídio, o que dado a descrição deste parágrafo parece-me muito claro.

Um fragmento da obra de Schopenhauer ilustra um pouco do contexto do isolamento trazido pela nobreza do ser e a individualidade das ações. [...] A Vida é Dor. Quem deseja, sofre; quem vive, deseja; a vida é dor. Quanto mais elevado é o espírito do homem, mais sofre. [...]

Não busquem julgar o sofrimento de seus pacientes como válido ou não. BUSQUEM APENAS AJUDAR

Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana... Carl Gustav Jung


Fontes:

Jill M. Hooley. Joseph C. Franklin. Matthew K. Nock. Chronic Pain and Suicide: Understanding the Association. Curr Pain Headache Rep (2014) 18:435

Ricardo Rodrigues Teixeira. Três fórmulas para compreender "O suicídio" de Durkheim. Interface (Botucatu) [online]. 2002, vol.6, n.11.


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